A história a seguir não é de minha autoria, porém a edição para transformar uma sequência de tweets em uma narrativa é toda minha:
Aconteceu comigo, essa é uma daquelas histórias que parece que nunca vai acontecer com a gente, mas chega uma hora para todos. Pois bem, eu peguei o ônibus para ir até a faculdade ontem por volta das 18h como faço todos os dias, mas chegando perto da hora de descer o trânsito ficou muito ruim, devo ter ficado uns 20 minutos pra andar 30 metros, no que desço do ônibus entendi porque tava ruim o trânsito: tava tendo alguma manifestação ali nas proximidades e eu precisava atravessar a manifestação pra pegar o meu outro ônibus, mas eu estava com medo e resolvi esperar um pouco.
Então uma menina começou a conversar comigo, disse que também tava com medo de atravessar mas que tinha prova e não queria se atrasar. Ela perguntou se eu podia acompanhar ela - quem me conhece sabe que eu não sou uma boa proteção, sou pequeno e fraco - mas a menina era ainda menor e mais fraca que eu, falei que ia sim ajudar ela a passar por aquelas pessoas, dei a mão pra ela e falei: 'segura forte e não solta por nada'.
Os primeiros passos dentro da multidão foram tranquilos, o pessoal dava espaço pra gente passar, mas foi ficando cada vez mais difícil, já tinha dado uns 10 minutos, de repente ela soltou a minha mão, fiquei procurando, entre um empurrão e outro a moça que eu havia prometido ajudar, estava preocupado com o que poderia ter acontecido, afinal já estava escuro e as pessoas não estavam mais tão amigáveis quanto no início da travessia.
Me perdi não só dela, como perdi a orientação também pro mundo externo, na busca pela menina eu acabei fazendo alguma volta errada e saí longe do meu ponto, já tinha aceitado que não ia achar a moça e ia seguir pra minha aula. Entrei de volta no meio do povo e segui reto, direto pra onde eu deveria ir, nisso escuto alguém gritando muito mais alto, um grito de angústia e as pessoas pedindo por socorro, para que alguém fosse ajudar uma menina. Podia ser qualquer menina, mas eu senti que era a minha nova amiga, minha culpa não ia permitir sair de lá sem certeza de que não era ela.
Segui os gritos de socorro e cheguei em uma pequena rodinha, eu então vi que tinha uma moça caída no chão dessa rodinha mas não me deixavam passar pra ver quem era, quando eu finalmente consegui ver o tênis da menina, era ela! Algo tinha acontecido com a menina que eu fiquei de proteger, já me desesperei e comecei a gritar: 'ME DEIXEM PASSAR, EU CONHEÇO ELA'. Quando finalmente me ajoelhei do lado dela caída eu perguntei o que tinha acontecido, mas ela não conseguia nem sequer falar, só me olhava com um tom de desespero, eu não sabia o que fazer, então comecei a gritar pra chamarem uma ambulância, fiquei segurando a mão dela enquanto algumas pessoas prestavam os primeiros socorros, quando me passaram o telefone perguntaram onde era a emergência e o nome da vítima, foi quando eu percebi que eu não sabia nem o nome dela, eu nem me importei em perguntar
quando ela chegou do meu lado, eu só quis ajudar.
Mas agora eu queria saber, era uma questão de honra. Fui do lado dela e perguntei: 'tu consegue me dizer teu nome?' E ela com muito esforço: meu nome é Samara, tenho 14 anos (teria se estivesse viva), morri aos 13 anos em Cascavel-PR. Eu andava de bicicleta quando não pude desviar de um arame farpado. O pior foi o dono do lote que não quis me ajudar, riu bastante de mim após agonizar por 2h enroscada no arame faleci.